29 de março de 2024

Jundiaí /SP

Tema: “Fraternidade e superação da violência”

Lema: “Vós sois todos irmãos” (Mt 23,8)

“Prezados irmãos da Igreja de Deus que se faz presente na Diocese de Jundiaí:

Desde o ano de 1964, no tempo da Quaresma, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) celebra a Campanha da Fraternidade (CF), focalizando uma situação existencial que aflige o povo brasileiro.

Se a Quaresma nos convoca à conversão, a Igreja exorta-nos a transformar a nossa vida cristã a partir de gestos concretos de fraternidade e solidariedade para com os irmãos que mais sofrem e carecem de vida digna. Nesta perspectiva, o Papa Francisco, na Mensagem que dirigiu à Igreja, por ocasião da Quaresma deste ano, pede-nos para não deixar resfriar o nosso amor para com Deus e para com o próximo, conforme Mt 24,12: “Porque se multiplicará a iniquidade, vai resfriar o amor de muitos”.

“Fraternidade e superação da violência” é o tema da CF deste ano. O Evangelho de Mateus inspira o lema: “Vós sois todos irmãos” (Mt 23,8). O Objetivo Geral da CF-2018 é: “Construir a fraternidade, promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da Palavra de Deus, como caminho de superação da violência” (cf. Texto-Base da CF 2018, n. 15).

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a violência se caracteriza pelo uso intencional da força contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo de pessoas. Essa violência pode resultar em dano físico, sexual, psicológico ou morte (cf. Texto-Base da CF 2018, n. 6). Infelizmente, a violência tem aumentado de forma assustadora em nosso país. Por exemplo, embora possua menos de 3% da população mundial, o Brasil tem quase 13% dos assassinatos no planeta. Os números apontados pelo Mapa da Violência 2016 mostram que, no Brasil, cinco pessoas são mortas por arma de fogo a cada hora. A cada único dia são 123 pessoas assassinadas dessa forma. Por ano, quase 60 mil brasileiros são assassinados, sendo a maioria pobres, negros, jovens e moradores da periferia. Grande parte destas mortes decorre da violência relacionada ao tráfico e ao consumo de drogas ilícitas e de álcool. Outro dado alarmante: se antes a violência era um problema relativo às grandes cidades, em tempos recentes, numerosos fatores fizeram com que ela chegasse também aos médios e pequenos municípios. A maior disponibilidade de armas de fogo ajudou também no crescimento recente dos homicídios.

Vários fatores contribuem para que a violência se torne um fenômeno tão enraizado em nosso país. O Brasil é uma sociedade injusta, excludente e extremamente desigual. Injustiça, exclusão e desigualdade são fatores que geram múltiplas formas de violência. A fome, o desemprego, a falta de moradia, de políticas públicas de proteção e promoção de direitos são tipos de violência que afetam a dignidade humana. Além disso, a ausência ou ineficiência do Estado, a morosidade da justiça, a corrupção generalizada, como também a falta de políticas e ações eficazes de proteção e defesa da população, principalmente dos mais carentes, favorecem a instalação do crime organizado e da violência sistemática.

É também inegável que a sociedade mudou radicalmente nos últimos anos. A ética, o respeito pelo outro, as boas maneiras e a ternura que norteavam as relações sociais foram sendo esquecidos. Hoje, há muita agressividade e atitudes egoístas em nossos gestos e palavras. Bem mereceríamos as palavras duras do profeta Isaías: “Acontece que vossas mãos estão manchadas de sangue, vossos dedos, manchados de crimes, vossos lábios proferem mentiras, vossas línguas murmuram calúnias” (Is 59,3). De maneira ou outra, somos cúmplices da “cultura da violência” que caracteriza nossa vida pessoal, familiar, comunitária e social. Deste modo, várias são as vítimas dessa realidade em nossos dias: vítimas da violência racial, violência contra menores e mulheres, violência contra os trabalhadores rurais e povos indígenas, violência causada pelo preconceito, discriminação e pela intolerância religiosa, violência no trânsito…

Queridos irmãos diocesanos: nesta CF queremos refletir sobre a realidade da violência e unir as nossas forças para superá-la, pois cremos no Evangelho de Jesus Cristo que anuncia a reconciliação e a paz. Cremos em Jesus que, mesmo morrendo injustamente uma morte violenta na cruz, perdoou seus algozes (cf. Lc 23,34) e venceu a violência pelo amoroso dom de sua vida a Deus pela redenção da humanidade, unindo-a numa só família de irmãos e irmãs pela força do Espírito Santo: “Vós sois todos irmãos” (Mt 23,8).

Muito pode ser feito para a superação da violência. O desenvolvimento de uma cultura de paz implica a ampla ação institucional, sobretudo no que se refere ao Estado, mas é igualmente necessária a ação da sociedade civil, dos grupos e dos indivíduos, de modo que se instaure uma radical mudança em nossos relacionamentos sociais. De fato, a construção de uma cultura de paz está intimamente relacionada à promoção da democracia e ao fortalecimento das instituições democráticas; ao desenvolvimento econômico e social sustentável, com garantia da participação de todos; à erradicação da pobreza e das desigualdades; à eliminação de toda forma de discriminação; ao respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais; à promoção da tolerância, da diversidade e da solidariedade. É preciso investir urgentemente na educação do senso moral das pessoas, e isto não se faz apenas a partir de uma educação de qualidade, mas também a partir da educação que se recebe na família, porque ninguém nasce violento! Também as comunidades eclesiais devem ajudar muito na superação da violência mediante o fortalecimento do espírito fraterno, as obras sociais e a vivência de uma espiritualidade que forme pessoas que acreditam na possibilidade de uma autêntica convivência fraterna. Especialmente neste Ano Nacional do Laicato, os cristãos leigos e leigas precisam assumir mais sua vocação de serem “sal da terra e luz do mundo” (cf. Mt 5,13-14).

A todos abençoo, desejando que nós acolhamos os apelos da CF deste ano, a fim de podermos superar a violência e construir a tão sonhada e necessária cultura da paz, da reconciliação, do amor e da justiça.”

Dom Vicente Costa
Bispo Diocesano

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